segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Microcrédito via Renda Básica de Cidadania

Desde nosso primeiro relatório sobre os resultados do pagamento de uma Renda Básica de Cidadania em uma comunidade já havíamos aventado a possibilidade de trabalhar-se a Renda Básica junto com o microcrédito.
O fato de algumas famílias terem aproveitado a RB como se fosse um microcrédito já era por si indicio suficiente da viabilidade de se aplicá-las em conjunto.



Propusemos no anexo ao primeiro relatório da RBC o que viria a ser o Banco Social, onde o microcrédito e a renda básica aliada simbioticamente a renda básica provendo a demanda e o microcrédito vindo a atendê-la e neste círculo de desenvolvimento viabilizar a emancipação da comunidade. Emancipação entendida como o momento em que a comunidade teria condições de bancar sua própria rede de seguridade, ou mais especificamente pagar a renda básica para todos com o rendimento de suas economias. Utilizando como elemento otimizador deste processo a moeda social.



Próximo de completar 3 anos de projeto a tendência permanece, agora que finalmente conseguimos capitalizar o fundo que garantirá a provisão da RBC em QV podemos enfim aproveitar todo esse potencial fiduciário e introduzir o microcrédito.



Ao contrário da RBC a qual só possuíamos referenciais teóricos, o microcrédito tem uma base experimental razoável e até mesmo um paradigma consolidado no Grameen de M.Yunus. No Brasil que já tem inclusive um marco legal estabelecido, que se por um lado regula por outro mais engessa o que talvez seja o bem mais valioso do empreendedorismo, a inovação. E embora recentemente o marco legal esteja mais próximo dos propósitos morais e econômicos do microcrédito ao reduzindo o juros anos de 20 para 8 por cento ainda sim está muito longe do paradigma das microfinanças e de economia solidária. Muitas inovações neste campo quando não são simplesmente proibidas são tornadas proibitivas por normas que vão do desnecessário ao contraprodutivo. Vai assim o Brasil perdendo a chance de se livrar dos vícios e idiossincrasias históricos ligados as burocracias e autocracias.



Não vamos nos prender a essas regras, nem ficar chorando por causa delas, vamos empreender sem segui-las nem desobedecê-las. O que significa o que aqui apresentaremos talvez não seja de acordo com a legislação brasileira em vigência naquilo em que esta se refere pelo termo microcrédito, mas que em essência, finalidade, moralidade, condiz perfeitamente ao espírito da economia solidária e a definição do microcrédito globalmente difundida. Aqui sintetizada como:
• O crédito de pequena monta;
• de juros baixos;
• dirigido às pessoas que não tem acesso ao sistema financeiro tradicional justamente por não possuem capital para dar em garantia, ou seja, pobres.



Como veremos a nossa proposição se encaixa perfeitamente nesta definição, contudo durante nossa experimentação não aplicaremos os juros, em respeito à legislação brasileira. Embora haja arranjos legais onde essa aplicação seria possível, tal engenharia jurídica por si nada agregaria a nossa finalidade social, enquanto a ausência de juros ou juros 0 embora seja um grave obstáculo à sustentabilidade do empreendimento, não o é da experiência e da sua replicabilidade do modelo, mais facilmente reconstituído em territórios sem os mesmos impedimentos ou ao menos com menor burocracia.



Tudo isto devidamente posto vamos a proposta:
O microcrédito que será disponibilizado não se dará propriamente como um empréstimo, mas sim como uma espécie de adiantamento de n parcelas da renda básica que já são pagas mensalmente dentro de comunidade protegida por uma renda básica garantida, aqui Quatinga Velho. Sendo estas parcelas restituídas automaticamente no pagamento das rendas básicas no período conforme valor definido pelo próprio tomador do adiantamento ou empréstimo.



Embora esse adiantamento seja de um capital que devido como direito, não deixa de ser um crédito concedido por:
• Não ser um valor concedido do indivíduo para si mesmo, mas da comunidade para o indivíduo. De A para B.
• Não estar o valor a ser restituído indexado ao valor da renda básica. Logo seu montante podendo não corresponder ao valor de um adiantamento da renda básica no período da duração da sua restituição.



Contudo há um diferencial, porém positivo, a insolvência e possibilidade de inadimplência é anulada pela própria renda básica garantida. A pessoa tem na própria renda básica a garantia que terá condições de pagar pelo empréstimo, dada a garantia incondicional da renda básica provida como direito.



Mas há que se tomar cuidado. Pois se isso por um lado elimina a inadimplência, ou conflitos e pressão da comunidade sobre, abre a possibilidade do tomador que não conseguir utilizar esse capital adequadamente se ver durante o período privado de um percentual de sua renda básica!



Tal situação deve ser evitada, e evitada seguindo os princípios da eficiência, economicidade e liberdade individual. Por isso neste primeiro experimento do microcrédito através da renda básica decidimos implementar uma concessão gradual com restituição de médio e longo prazo, isto é, partindo de valores baixos, pagos em parcelas igualmente baixos que comprometam o menor montante possível da renda básica no período. Este “possível” significa a relação entre uma restituição que não comprometa a finalidade da renda básica e um montante que represente um capital necessário a finalidade do microcrédito, seja ele a quitação de uma dívida com juros abusivos, um pequeno empreendimento, ou mesmo a compra de um produto ou serviço que o tomador deste microcrédito necessário.



É preciso ainda levar em consideração o longo período que uma restituição de pequena monta pode implicar para recompor o capital para novos empréstimos. Pois embora não seja um problema capaz de inviabilizar o sistema, pode torná-lo pouco eficiente para a finalidade do desenvolvimento socioeconômico. Tratando-se, portanto não de uma questão estrutural, mas de velocidade de circulação, símile aos sistemas livres já aplicados a Brinquedoteca e Biblioteca livres, podemos acelerar a restituição, ou nesse caso a quitação do empréstimo, pela possibilidade imediata de contrair um novo.



Claro que onde existe a cobrança de juros, a quitação do empréstimo já é estimulada pela própria eliminação deste. Porém a possibilidade de adquirir um novo empréstimo de maior monta, ou mesmo o simples fato de poder acessar novamente o crédito, é mais do que suficiente para que havendo a possibilidade se quite o mais rapidamente possível o empréstimo. Tal possibilidade de quitação pode ser decorrência do próprio incremento de renda gerado a partir do microcrédito.



Numa relação evidente no microcrédito produtivo orientado, mas não exclusiva deste modelo. Conforme observamos em Quatinga Velho, mesmo um microcrédito aplicado em um bem de consumo, como uma TV, ou melhor ainda um computador, pode representar não apenas a médio e longo prazo num incremento nas possibilidades socioeconômicas da família, mas inclusive a curto prazo a medida que o simples acesso a informação! Tal incremento não pode ser deduzido a partir de um estudo de caso linear e reduzido, mas isso não é razão para eliminar essa possibilidade de desenvolvimento de um sistema, embora torne evidentemente mais complexo o planejamento do programa de microcrédito ter que trabalhar com tais variáveis, o que ao menos em princípio nos leva a optar por dar prioridade para os microcréditos cujo montante envolvido apenas de menor monta, mas cuja possibilidade de quitação adiantada seja mais evidentes.



Deixando-nos abertos para trabalhar durante a experiência com a hipótese de que em sistema de microcrédito que envolve maior número de empréstimos, o retorno possa ser maior se não condicionado a uma única, ou pouca tipificação de crédito. Isto é que não apenas a multiplicação dos beneficiados, mas uma maior diversidade em suas finalidades possa produzir um conjunto muito maior de oportunidades aproveitadas em relação ao modelo em que estas são reduzidas as tipificações enumeradas e controladas.



Assim a preferência pelos denominados microcréditos para produção dentro do programa se darão neste momento pelas limitações dimensionais do sistema, e do reconhecimento de nossa impossibilidade para efetuar o cálculo complexo de previsão das reais possibilidades desenvolvimento da economia local com a diversificação dos microcréditos.Entretanto talvez tais cálculos sejam não apenas dispensáveis, mas menos efitetivos diante de critérios, simples, não-arbitrário e sobretudo entendidos como justo pela comunidade em decisão democrática.



Neste sentido como critério ainda mais simples de elegibilidade, ou melhor, prioridade para o empréstimo, dado que o montante é limitado, sugerimos a adoção do critério mais fácil de ser entendido, aplicado e controlado por democracia direta. Nesta primeira fase do microcrédito iremos priorizar:
• Os microcréditos de menor monta - que salvo exceções atenderiam justamente a sua finalidade, atendendo quem menos têm e proporcionalmente mais precisa. Gerando ainda um retorno mais rápido sem comprometer o orçamento da família.
• como critério em eventual desempate: os microcréditos quitados em menos tempo.



Já a preferência, ou melhor prioridade na concessão de novos créditos serão dentro dos mesmo critérios acima descrito, para aqueles que já quitaram seus empréstimos. Isto não apenas como estímulo ou reforço para uma quitação imediata visando reduzir a espera para o retorno do capital , mas também como importante processo de educação financeira essencial para modelos que apostam na livre iniciativa e liberdade dos envolvidos.



Da mesma forma que a gradação nos montantes emprestados, partidos dos valores e restituições mais modestas possíveis não é apenas uma questão de preocupação com o comprometimento e privação de uma renda básica já extremamente modesta mas prudência que funciona como processo pedagógico a medida que não contamos que todos saberão de imediato lidar com o microcrédito.



Aqui cabe uma advertência, talvez essa precaução seja absolutamente desnecessária e sejamos mais uma vez surpreendidos como já o fomos com os sistemas livres e a renda básica. Contudo, ao longo do projeto podemos flexibilizar e até mesmo eliminar essas regras se assim se não se mostrarem efetivas.



Por outro lado é importantíssimo ressalvar que não estamos partindo do princípio de que pessoas não são capazes de identificar, planejar e aplicar adequadamente esse crédito de modo a não passar por condições adversas, mas admitindo a possibilidade que muitos que jamais tiveram chance de apreender com a melhor escola que existe a da experimentação, onde a tentativa e erro são parte não apenas integrante do processo de desenvolvimento deste potencial que entendemos que não precisa de tutores mas de oportunidade de aprendizado.


Assim ao partir de montantes e restituições de baixa monta, procuramos reduzir o possível impacto de um microcrédito que mal aplicado pelo tomador não dê um retorno esperado ou mesmo nenhum, de modo que mesmo o erro possa ser absorvido sem prejuízos materiais ao indivíduo, ou ao seu processo de educação financeira. Afinal, de qualquer forma na pior das hipóteses o empréstimo será quitado no prazo original, abrindo nova oportunidade para uma tentativa dentro dos mesmos patamares ou conforme o entendimento provido pela experiência em níveis menores de comprometimento do seu orçamento.



O conceito é prover um sistema de crédito onde a confiança e iniciativa não sejam prejudicadas pelos inevitáveis tropeços, e que ao mesmo tempo se constitua em um processo no qual é o tomador de empréstimo que colhe as conseqüências do processo em um nível adequado as suas condições socioeconômicas e psicológicas, desenvolvendo assim a responsabilidade e preparando-o de fato e naturalmente para assumir compromissos maiores. A isso entendemos como o próprio processo de aprendizado envolvido no programa: a educação como desenvolvimento de potencialidades latentes ou até mesmo bloqueadas pela falta de oportunidade pela simples familiarização com o sistema aplicado vigente, no caso o próprio programa de microcrédito calçado na renda básica garantida. Oportunidade de aprendizado não apenas para o indivíduo que toma o microcrédito, mas para aquele que o fornece, a comunidade.



Aqui novamente aplicaremos o princípio da democracia direta, não na escolha de quem deve ou não deve receber o empréstimo, mas dos níveis de crédito e, sobretudo de um questão importantíssima: o crescimento do capital disponível para o microcrédito. Claro isso poderia ser facilmente resolvido com os juros conforme deliberação democrática da comunidade seja com níveis iguais, equitativos, progressivamente menores ou mesmos maiores. Lembrando que neste modelo os juros não são uma “compensação ou recompensa pelo risco”, mas sim um excedente dirigido a manutenção operacional do sistema e crescimento do capital disponível ao microcrédito.



Pode-se ser inclusive do entendimento jurídico que tais finalidades descaracterizem esse pagamento excedente como juros. Porém para não nos perdermos neste debate, o capital será acrescido por doações. Doações estas que serão propostas inclusive aos tomadores de empréstimo que podem inclusive estar baseadas em percentuais do valor emprestado, sendo doadas mês ao mês ou como se fossem parcelas adicionais após a restituição do empréstimo. Comportando-se exatamente como o pagamento de juros, mas não se caracterizando como tal por uma razão muito simples: seu pagamento é voluntário e jamais se configura como uma dívida ou compromisso de contribuição.



O que não impede que a comunidade entre em acordo para que todos contribuam com valores iguais ou equitativos para esse fundo de microcrédito, atrelado ou não aos empréstimos, o que equivaleria neste segundo caso a uma espécie de taxa de uma associação de microcrédito.



O importante aqui é novamente o trabalho informativo. Dado que o crescimento do volume disponível do microcrédito é do interesse dos próprios usuários, ou seja, a comunidade, a contribuição voluntária é perfeita viável e inclusive condizente aos interesses particulares de todos na medida da compreensão do fato que o aumento do microcrédito disponível dependerá em parte da própria contribuição da comunidade. Aqui cabe novamente em um paralelo com a Brinquedoteca e Biblioteca Livres, que num dado momento passou a receber doações dos próprios usuários. É obvio que isso não aconteceu em virtude de nenhum cálculo racional utilitarista, mas sim de impulso ou instinto de solidariedade ou mais precisamente de reciprocidade ou gratidão inerentes não apenas ao seres humanos, mas a todos seres vivos dotados de suficiente inteligência.



Em síntese a renda básica não apenas serve de calção e capital para o microcrédito , mas como geradora da demanda a ser atendida pelos microempreendimentos emergentes. Note-se que o pagamento de juros poderia propiciar não apenas o crescimento dos montantes disponíveis ao microcrédito, mas uma maior renda básica, inclusive concomitantemente.



Por exemplo: uma família com 10 membros, que recebe por mês uma renda básica de 30 reais por mês, poderia estar precisando de justamente 300 reais para comprar galinhas e materiais para construir um galinheiro e vender os ovos na vizinhança. Ela poderia tanto decidir pagar esse empréstimo deduzindo três reais de cada renda básica durante 10 meses, ou apenas 1 real durante 30 meses, ou em qualquer arranjo possível considerando:
• a disponibilidade de recursos depositados no fundo;
• e as possibilidades de comprometimento de uma parte da somatória das rendas básicas dos envolvidos.



Independente do sucesso ou não do empreendimento a restituição sempre ocorre e na pior das hipóteses dentro no prazo combinado, e se as possibilidades da família tiverem sido bem consideradas, sem nenhuma privação. Dependendo ainda do retorno desse microempreendimento, aqui no caso a venda dos ovos, será interessante para o tomador do microcrédito quitá-lo o mais rapidamente, abrindo nova possibilidade para receber o adiantamento, com mais confiança e experiência para talvez tomar valores maiores do que o primeiro.



Note-se que não apenas famílias poderão usar sua renda básica, mas famílias associadas ou até mesmo toda a comunidade, no caso de um empreendimento coletivo, como a compra de um veículo para uso comunitário, a abertura de um poço, a criação de uma cooperativa de consumo ou produção, ou qualquer outro empreendimento que careça ou passa ser realizado em comum acordo por um grupo.



No momento que estes microempreendimentos form
arem uma considerável economia local será possível incrementar estes empréstimos no todo ou em parte através de moeda social. Mas isso é próxima etapa que devera ainda aguardar as primeiras avaliações do resultado do microcrédito por renda básica e os sempre necessários ajustes que só a experiência pode propiciar a qualquer programa.


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A variação é possível, pois embora a RB não seja um dividendo social variável mês a mês, pode esta sim ser alterada no período para se adequar ao que é considerado e deliberado democraticamente como correspondente ao básico.
Usamos a palavra evidente e não maior, de acordo com a nossa concepção epistemológica que não maior probabilidade de ocorrência ou verdade para aquilo que é conhecido ou mais facilmente compreendido em detrimento do que é mais complexo, ou desconhecido, e, portanto não inferindo para o desconhecido ou complexo, menor possibilidade de ocorrência nem muito menos falsidade.
Retorno aqui não apenas de velocidade do sistema, mas de rentabilidade naqueles que puderem aplicar juros.
Note que a velocidade do sistema perde significância na recomposição a medida que a rotação dos empréstimos aumenta, sendo uma questão fundamental apenas no início onde o capital disponível é limitado tanto em reservas quanto em circulação.
E extremamente modesta aqui quer dizer uma renda básica que começa a beirar o insuficiente para receber esse nome. Os 30 reais estão no limiar de renda básica. Seria muito melhor iniciar o projeto quando tivéssemos uma renda básica de 50 reais, contudo se nossa política fosse a de esperar condições ideais para agir, não existiria sequer a renda básica.
Logo o papel do orientador não é o de ensinar, conduzir, ou sequer induzir o processo de aprendizagem mas sim de maximizar o proveito da oportunidade de aprendizado, a experiência.
Que fique bem claro: do entendimento do tomador de empréstimo.
Não o é. Graças novamente por seu caráter voluntario. Taxas são por definição compulsórias.
Quase ninguém tem a consciência de que quando compra um produto para ajudar alguém que bate em sua porta esta contribuindo não apenas com o vendedor, mas consigo mesmo, a medida que quando compra não apenas quando precisa mas quando pode, está reduzindo os preços dentro de suas imediações. E não precisa ter a solidariedade, permite aqui a sobrevivência de um concorrência que desapareceria sem ela, e o faria refém da conveniência, afinal quem só compra quando lhe é conveniente pagará, e caro esta conveniência. A solidariedade é essencial ao equilíbrio natural dos mercados, sem elas os custos explodiram, o que talvez explique que no exato momento em que escrevo estas linhas é possível encontrar banana mais barata em alguns lugares de Nova Iorque do que em São Paulo!
Havendo reservas para tanto.
Ou contribuições voluntarias equitativas e proporcionais com efeito de.
Sempre dentro do entendimento de créditos de pequena monta.

BANCO SOCIAL DA RENDA BÁSICA DE CIDADANIA

CAPITAL E LIBERDADE
Se nosso aprendizado nestes 4 anos de busca obstinada pelo desenvolvimento humano pudesse ser resumido a algumas poucas palavras, diríamos que a chave para a transformação social está no Capital e na Liberdade seu perpétuo caminho.
Liberdade real, não o resto da subtração liberal entre “tudo aquilo que posso fazer por minha conta” e “tudo o que não me é proibido por aqueles que me cercam”. A verdadeira liberdade: produto libertário da somatória de capacidades, oportunidades e direitos garantidos a cada indivíduo, multiplicada pelas mesmas liberdades e direitos de (e para) todos os demais .
Isto é Liberdade. Mas e o Capital? Que Capital é esse que procuramos disponibilizar e compartilhar em nossos projetos? Um Capital que não se resume a renda; que não é meramente educação; nem tão pouco apenas democracia?
É o Capital em sua integralidade: é renda básica de cidadania; é informação; é democracia direta. Cada um isoladamente se constituindo por si só numa forma especifica de capital, ao mesmo tempo, que são faces de um mesmo capital que é uno, tridimensional e eminentemente social.
Isto é Capital: crédito, conhecimento e cidadania. Compreendemos o Capital como todos estes bens comuns, unidos e compostos cada qual por todos; e o Todo (o capital social) tridimensionado na interação entre cada esfera sem a exclusão de nenhuma das demais.
Assim como as esferas Econômicas, Cultural e Política se inter-relacionam (tri) tridimensionando a rede denominada sociedade. O capital produzido e compartilhado em cada uma destas dimensões compõe o que denominamos capital social ou simplesmente Capital.
Porque se a renda é capital econômico; se a educação é capital cultural; e se o associativismo é capital político, nenhuma das três deixa de ser composta pelas demais, nem pode ser ignorada na formação do Capital Social e conseqüentemente do próprio desenvolvimento humano.

O CONSÓRCIO DA RENDA BÁSICA DE CIDADANIA EM QUATINGA VELHO
Tudo isso que numa primeira leitura pode parecer bastante abstrato, é para nós, hoje, a estrutura conceitual que norteia as práticas do ReCivitas em direção a Liberdade- sendo uma das principais razões para os resultados que temos obtido com a Renda Básica de Cidadania em Quatinga Velho.
Contudo essa visão que nos norteia, embora estivesse presente em nossos princípios desde a fundação do ReCivitas, só viria a se estruturar e confirmar a partir da experiência em nossos projetos, ou, em outras palavras, na prática – como não poderia deixar de ser.
Nasceu e se impôs como resposta aos dilemas enfrentados por toda organização da sociedade civil que se dispõe não apenas a atuar, mas ir além, até a raiz do problema que se propôs enfrentar: a pobreza. Pobreza não apenas em seu sentido usual, mas total: a ausência de equilíbrio ou equidade na sociedade, a carência de capital social, presente, portanto, em todas as esferas da sociedade ainda que se dê maior ênfase a esta ou aquela geralmente a econômica, e cultural, raramente a política, e quase nunca a total - a Social.
Embora a distribuição de renda ganhe espaço graças ao sucesso dos programas governamentais - que merecem elogios por combater a pobreza econômica direto na raiz (dinheiro), e que com a mesma imparcialidade merece críticas, por fazê-lo de forma a disseminar a pobreza humana (cultural) e, sobretudo política, ao agregar condicionalidades e obstáculos burocráticos que abrem espaço para o clientelismo e paternalismo junto com toda sorte de tecnocretinismos – a educação, quase sempre palavra destituída de qualquer outro significado maior, além de uma visão idílica dos depósitos de crianças denominados escolas, clama, insiste em chamar nossa atenção.
Quase como um reflexo condicionado, a educação que nós recebemos parece que nunca deixa de se repetir em nossa mente sua importância fundamental, ainda que não tenhamos a menor idéia do que é pedagogia, ou muito menos que o aprendizado que vai muito além do alcance das instituições de ensino.
É, portanto, perfeitamente desculpável nossa primeira reação de buscar na educação a solução única para todos os problemas sociais. Contudo, conforme defrontamos a realidade fora da perspectiva irreal do “observador e seu objeto de estudo”; conforme saímos do plano teórico para a experimentação, ou literal vivência dos problemas que fomos acostumados a “conhecer” de posições privilegiadas, vai ficando cada vez mais claro o quanto é impossível supor a instrumentalização da “promoção de consciências ambientais”, “da difusão de responsabilidades sociais”. Como falar de consciência, responsabilidade ou até mesmo direitos para pessoas submetidas a níveis de privação desumanos? Desumanas a ponto de não ter como pensar em outra coisa senão a sobrevivência imediata - e “imediata” quer dizer não amanhã, mas hoje. Como falar em futuro, onde não existem perspectivas? Como falar de abstrações onde de concreto não existe sequer o básico?
Trabalhando e, sobretudo, vivendo em condições de privação e destituição dos recursos mais fundamentais a vida e dignidade, se tornava enfim evidente (sensível) o inegável: é impossível qualquer desenvolvimento humano onde não existe a mínima garantia a sobrevivência.
Claro que uma renda básica garantida não seria a solução de todos os problemas, mas nenhum problema poderia sequer começar a ser resolvido sem ela. Pelo simples motivo que fazia absurda qualquer ação onde não existam direito a vida ou liberdade, uma renda básica incondicional era um primeiro passo essencial.
Contudo desta primeira certeza surgiriam, naturalmente, novas dúvidas: como garantir uma renda incondicional sem ferir a dignidade, a livre iniciativa, ou mesmo, interferir com a independência e responsabilidade de quem a recebe?
O conceito da Renda Básica Universal era a solução perfeita para esta questão à medida que sempre recompensava o trabalho; não promovia nenhum tipo de descriminação; e coibia a burocratização; mas o mais importante, não feria a dignidade, porque não se configurava como benesse ou assistência, mas sim direito (inclusive previsto em lei) .
Embora a incondicionalidade, inerente a definição da RBC, resolvesse muitos dos problemas relacionados à dependência, descriminação e clientelismo político, havia ainda uma questão que nem mesmo a incondicionalidade podia dar conta sozinha: o da geração de relações de poder inibidoras das livres relações geradoras do capital. Só seria possível eliminar os vícios tecnocráticos e coorporativos que coibiam o desenvolvimento dos ciclos virtuosos de confiança e reciprocidade em um modelo libertário que visasse a completa - ainda que necessariamente gradual - emancipação da comunidade política formada para e pela a RBC em democracia direta. Algo que conseguimos realizar pela adoção desde o inicio dos princípios de autodeterminação e democracia direta na comunidade pioneira de Quatinga Velho.
Para colocar em prática este modelo libertário ao longo destes 2 anos de projeto que se completam agora nos valemos somente de contribuições voluntárias de pessoas físicas que financiam a RBC nesta comunidade. Um Consórcio de Cidadãos, pagando diretamente a RBC para outros cidadãos. Modelo escolhido não apenas porque não encontramos apoio nem muito menos vontade política para que o poder público realize esse direito direto, como é seu dever, conforme a lei, mas porque o modelo de contribuições voluntárias é o mais coerentes como espírito não impositivo e coercitivo da RBC.
E se uma associação de pessoas dispostas a garantir a liberdade real para todos podem criar comunidades livres, democráticas e autodeterminadas, a associação (federação) destes núcleos também pode constituir uma verdadeira rede de segurança social, sociedades sem fronteiras, independentes e integradas. Por que não?
A erradicação (como a produção) da miséria em todas as suas dimensões não é só uma questão de vontade política (ou de governos,) mas essencialmente de economia política em sociedades livres - como sempre foi.

O BANCO SOCIAL
Solidariedade, mutualismo, associativismo e principalmente liberdade não são conceitos abstratos; podem e devem ser concretizados principalmente em sociedades democráticas que dispõe não apenas de livre mercado, mas de instituições financeiras e sistema monetário sólido o suficiente para tanto.
Ora se a RBC é capaz de erradicar a miséria é porque ela cria as condições fundamentais à segurança social (não-violência e não-privação) para o desenvolvimento humano e econômico. E se assim o faz é que não deve precisar de impostos nem imposições para se realizar, mas pura e simplesmente de capital para que se (re)produza também como capital. É passível sim, de incentivo e isenções fiscais, em modelo que talvez seria o único a se constituir como beneficio para toda a sociedade, não apenas porque não visa a mera acumulação financeira, mas também porque seu retorno incide diretamente na base econômica - podendo por esta razão gerar inclusive ganho de arrecadação para o próprio sistema tributário.
Eis porque da criação do Banco Social da Renda Básica de Cidadania, (o BIGBANK do artigo anterior), porque não é só perfeitamente possível implementar a RBC, é possível, e preferível, fazê-lo dentro do livre mercado com uma gestão democrática, competitiva e transparente que só uma instituição de interesse público da sociedade civil pode conferir.
Um Banco Social destinado a ser a instituição de financiamento destas comunidades democráticas formadas pelo contrato social de garantia ao direito a vida e liberdade através do instituto da Renda Básica Universal. O indutor descentralizado da criação desta Rede de Seguro Social sem Fronteiras – não como um modelo final, mas um ponto de partida a ser aperfeiçoado e replicado neste processo de livre constituição desta Rede Social.
Com este Banco Social o ReCivitas pretende demonstrar que é possível ultrapassar os paradigmas de políticas econômicas de classe: “de pobre para pobre”; “de rico para pobre”; (ou a pior), “de rico para rico”. É possível inaugurar política econômica universalista e libertária, de garantia de fato de direitos humanos e de exercício pleno da cidadania.
O desenvolvimento desta tecnologia social formada por: Banco Social da RBC; comunidades democráticas; e Rede de Seguridade, não se destina a “reduzir o fardo” do poder público, ou substituí-lo no cumprimento de seu dever; nem muito menos se propõe a eximir as grandes empresas e fortunas de sua responsabilidade social (ou falta de). Não vem para compensar acumulação de riquezas, nem para aliviar deveres públicos, é exercício de livre iniciativa, verdadeira porta de saída da passividade; da reclamação a ação; é a transformação do cliente-consumidor em investidor-cidadão.
O que na prática abre a possibilidade para que possamos financiar nossa própria segurança social, pela simples garantia a todos de uma renda incondicional através da associação para aplicação conjunta de nosso próprio capital financeiro, isto é, nossas economias, poupanças.
Sim, podemos bancar nossa própria seguridade diretamente, ao invés de pagarmos e esperarmos a vida inteira ou uma adversidade para começarmos a receber aquilo que é nosso por direito; e não como assistência, mas como o rendimento de um investimento social. Um investimento no próprio cumprimento da finalidade primordial de todo Pacto Social! –através de uma tecnologia social mais ampla e efetiva para a neutralização a violência antes de sua deflagração, simplesmente através da erradicação de suas principais condições geradoras: a miséria e a privação.
Em linhas gerais, eis a meta desta nova instituição financeira sem fins-lucrativos destinada ao financiamento da RBC, microcrédito e economia solidaria em sociedades livres. Partindo do princípio que o contribuinte não precisa renunciar ao seu capital; ao contrário, pode e deve receber o rendimento de seu investimento financeiro, humano e político. Recebendo o retorno financeiro de suas economias aplicadas exatamente como em qualquer instituição financeira ou banco, porém com a certeza que nenhuma parte dos valores geridos e gerados será distribuída a acionistas ou “donos”, nem se prestará a especulação financeira. Certeza que só processos transparentes e democráticos podem conferir de que o capital será aplicado nos setores produtivos, éticos e pacíficos da sociedade.
Investimentos cuja parcela acordada do rendimento das aplicações é sempre destinada ao pagamento da RBC. Prioritariamente em comunidades regidas pelos princípios da universalidade, democracia direta e autodeterminação, até a difusão gradual para todos, absolutamente todos os membros de nossa comunidade maior chamada Brasil; e por que não também, para aquela comunidade que naturalmente e inegavelmente pertencemos desde o nosso nascimento, a Humanidade.