segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Comunidade e Autonomia

O Ente, a identidade, e o indivíduo

O indivíduo autônomo não é aquele capaz de realizar por sua própria conta ou sem ajuda de ninguém, tudo que pode, tem vontade, ou muito menos deseja, mas o indivíduo que dispõe do necessário para realizar todo o seu potencial, de acordo com sua capacidade pessoal e as possibilidades do meio que está inserido ou da rede na qual se insere.

Comumente nos referimos à pessoa autônoma como aquela capaz de se sustentar sem a ajuda dos outros, O quando o indivíduo autônomo é aquele dotado da liberdade real para se realizar plenamente. Mas todos nascemos dependentes de nossas famílias, comunidade, sociedade e meio ambiente, e mesmo que confundamos liberdade com solidão, e nos apartemos de tudo e de todos, ainda sim como qualquer bicho dependeremos até a morte das disponibilidades senão dos demais de nosso ambiente.

É impossível recriminar o indivíduo que entre ser um morto-vivo em uma civilização completamente pervertida e adulterada, ou viver para morrer logo numa vida isolada e selvagem prefira a última saída. Contudo em verdadeiras sociedades, a liberdade real de um indivíduo não decai com a convivência dos demais, se amplia. Ou seja o nível de autonomia dos indivíduos depende da qualidade da vida comunitária entre todos.

Aparentemente paradoxal, a autonomia em comunidade, é o fenômeno que define não apenas a identidade de uma comunidade, mas a identidade de cada indivíduo. Mais do que isso, é a sociedade e a socibilização que faz do ente, pessoa dotada de liberdade. É um fenômeno reiterado, a coletividade gera a individualidade de cada indivíduo livre, e a livre interação entre todos indivíduos compõe a coletividade.

De fato o indivíduo dentro ou fora da sociedade é apenas um ente, uma peça ou parte do meio ambiente a medida que é obrigado apenas a agir e reagir com o intuito de manter sua existência, seja sendo obrigado a lutar por sua sobrevivência como animal selvagem na natureza, seja sendo obrigado a lutar pela sua sobrevivência como animal domesticado ou não na civilização. O leão não caca porque é livre nem o gamo foge porque tem liberdade.

O elemento essencial da sociedade é libertar o homem desta luta de todos contra todos, e de cada um contra a natureza, estabelecendo um estado de cooperação mutua, uma nova condição humana e humanizante onde a insegurança é tanto menor quanto maior é a liberdade de cada indivíduo, e maior é a liberdade de cada indivíduo quanto maior é o nível de segurança que este estado de cooperação e proteção social proporciona a todos.

Em outras palavras quanto melhor a vida social e o grau de cooperação, maior é o nível de segurança que todos desfrutam e maior é o grau de liberdade, contudo uma sociedade, não existe sem um contrato social onde a associação voluntária de todos em torno da garantia de um bem comum para todos. Ou sem seja sem liberdade individual não há comunidade e sem comunidade não há segurança social, e sem segurança social não há liberdade real para nenhum indivíduo, mesmo aos privilegiados, afinal de contas permanece o estado de medo original de perda ou tomada de seus privilégios, independente se estes são justos ou injustos.

A verdadeira liberdade não é não a condição do indivíduo livre do medos, privações, compulsões, obsessões, repressões e opressões, de outros sobre si, ou de si para si, mas o estado de razoável segurança ou certeza de que de se está e permanecerá livre destas violências e privações.

Libertar-se é emancipar-se não dos demais indivíduos livres, mas tanto dos estados naturais de privação quanto dos artificiais de dominação. Emancipar-se é tornar-se não apenas indivíduo plenamente livre, autônomo. A emancipação é o processo de construção da autonomia, um processo de libertação de todas as condições de privação e dominação que impedem o florescimento da livre iniciativa, vontade e consciência, que impede a própria transformação do ente em pessoa livre. Logo ser livre não é abandonar a vida em sociedade, mas poder tomar parte voluntariamente de uma, e pertencer a uma comunidade não é renunciar a sua vontade própria, mas participar da construção do espaço onde é possível exercê-la.

A interação social não gera apenas a identidade coletiva, a rede social de relações pessoais gera a própria identidade do indivíduo que se insere nesta comunidade.
A comunidade é o a rede formada a parte do conjunto de interações entre indivíduos autônomos E a autonomia é o estado de liberdade plena gerado a partir da livre interação entre estes indivíduos em comunidade.

O ente existe per se, porem sua identidade individual não se define isoladamente nem se constitui em isolamento ou confinamento, dentro ou fora das sociedades, mas pelo conjunto de relações e interações pessoais e sociais que compõe sua convivência social e comunitária. A identidade de cada indivíduo de define pelo contraste com as demais e da livre interação entre essa diversidade pessoal se compõe a própria indivídualidade. O eu tanto social quanto psicológico carece da interação não apenas com o mundo com o outro para se formar. E o eu verdadeiramente livre, sem carência de poder ou medo de ser é aquele que se forma não apenas pela interação com o outro, mas pela conexão com o próximo.

A coletividade e a individualidade assim como a liberdade e segurança não são elementos opostos, mas fenômenos interligados e que se geram e sustentam simbioticamente em rede. Sendo a coletividade o conjunto de indivíduos autônomos. E a individualidade o fenômeno da autonomia gerado na coletividade. Quanto maior a liberdade individual mais forte é o coletivo, e quanto mais coesos e solidários são os indivíduos mais forte é sua liberdade.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Microcrédito por Renda Básica Garantida

Desde nosso primeiro relatório sobre a renda básica de cidadania na comunidade de Quatinga Velho, já havíamos aventado a possibilidade de trabalhar a renda básica em conjunto com o microcrédito. O fato de algumas famílias terem aproveitado a renda básica como se fosse um microcrédito indicara esta possibilidade.
No anexo ao primeiro relatório da RBC já proporíamos o que viria a ser o Banco Social: microcrédito e renda básica em simbiose. A renda básica provendo a demanda e o microcrédito a atendendo, e vice-versa. Propondo ainda a moeda social como potencializador deste ciclo de desenvolvimento para emancipar da comunidade. Culminando no momento em que a comunidade teria condições de bancar sua própria rede de seguridade, ou especificamente, pagar a renda básica para todos na comunidade com o rendimento de suas próprias economias.
Próximo de completar 3 anos de projeto a tendência permanece. Agora que finalmente conseguimos capitalizar o fundo que garantirá a provisão da RBC em QV podemos enfim aproveitar todo esse potencial fiduciário e introduzir o microcrédito.
Diferente da RBG, o microcrédito já tem uma base teórico-experimental razoável e até mesmo um paradigma consolidado com o Grammen de M.Yunus. O Brasil que já tem inclusive um marco legal estabelecido, que se por um lado regula, por outro também engessa o que talvez seja o bem mais valioso do empreendedorismo: a inovação. Muitas inovações em economia solidária quando não são simplesmente proibidas são inviabilizadas por normas que vão do desnecessário ao contraprodutivo. Vai assim o Brasil perdendo a chance de se livrar dos vícios e idiossincrasias históricos ligados às burocracias e autocracias.
Entretanto não nos percamos nestas regras, nem fiquemos nos lamentando. Sem segui-las nem desobedecê-las apenas empreendamos. Neste sentido, o que apresentaremos aqui talvez não seja exatamente aquilo que se costuma referir pelo termo microcrédito, mas é em essência, finalidade, moralidade, perfeitamente condizente com o espírito e da economia solidária e das microfinanças. E pode ainda sim ser classificado como microcrédito, se este for definido como:
• O crédito de pequena monta;
• de juros baixos;
• dirigido às pessoas que não tem acesso ao sistema financeiro tradicional por não possuem capital, ou sem efemismos, os pobres.
Nossa proposição se encaixa nesta definição. Contudo durante nossa experimentação não aplicaremos os juros. Embora haja arranjos legais onde essa aplicação seria possível, tal engenharia jurídica por si nada agregaria a nossa finalidade social, enquanto a ausência de juros (ou juros = zero) embora seja um grave obstáculo à sustentabilidade do empreendimento, não o é da experiência e da replicabilidade do modelo, lembrando que existe outras exemplos a serem estudados para recompor ou ampliar o capital que não necessariamente passam pelo instrumento dos juros, vide as finanças islâmicas por exemplo.
Isto posto, vamos à proposta:
O microcrédito que será disponibilizado não se dará propriamente como um empréstimo, mas sim como uma espécie de adiantamento de n parcelas da renda básica que já são pagas mensalmente dentro de comunidade segurada por uma renda básica garantida, no caso, Quatinga Velho. Tais parcelas serão restituídas automaticamente durante o pagamento das rendas básicas conforme valor definido pelo próprio tomador do adiantamento ou empréstimo, empregando uma parte da renda básica a ser paga.
Embora esse capital advenha do pagamento de um direito, não deixa também de ser um credito concedido. Em razão de:
• Não ser um valor concedido do indivíduo para si mesmo, mas da comunidade para o indivíduo. De A para B.
• Não estar o montante a ser restituído indexado ao valor da renda básica. Seu montante pode ou não corresponder ao valor de um adiantamento da renda básica no período da duração da sua restituição. Ou seja o indivíduo deve x reais e não x rendas básicas.
Contudo há um diferencial, positivo em relação ao microcrédito convencional a insolvência e possibilidade de inadimplência é anulada pela própria renda básica garantida. A pessoa tem na própria renda básica a garantia de que terá as condições de pagar pelo empréstimo, dada a natureza incondicional da renda básica.
Mas há que se ter cuidado. Pois se isso por um lado isto elimina a inadimplência e a pressão da comunidade, por outro se abre a possibilidade do tomador se ver durante o período de pagamento privado de uma percentual importante de sua renda básica.
Tal situação deve ser evitada, mas dentro dos princípios da eficiência, economicidade e liberdade individual. Por isso neste primeiro experimento do microcrédito através da renda básica decidimos implementar um concessão gradual com restituição de médio e longo prazo, isto é, partindo de valores baixos, pagos em parcelas igualmente baixas que comprometam o menor montante possível da renda básica no período. Este “menor montante possível” significa uma restituição que não comprometa a finalidade da renda básica e que ao mesmo tempo seja um capital suficiente a finalidade do microcrédito. Seja esta finalidade a quitação de uma divida com juros abusivos, um pequeno empreendimento, ou mesmo a compra de um produto ou serviço que o tomador deste microcrédito necessário.
É preciso ainda levar em consideração o longo período que uma restituição de pequena monta pode implicar para recompor o capital para novos empréstimos. Pois embora não seja um problema capaz de inviabilizar o sistema, pode torná-lo reduzir sua eficiente na finalidade do desenvolvimento socioeconômico. É portanto uma questão de velocidade de circulação, para a qual adotamos solução símile aos dos sistemas livres, já testada na Brinquedoteca e Biblioteca livres. Nestes sistemas aceleramos a restituição, neste caso a quitação do empréstimo, não pela ameaça de punição, mas sim pelo estímulo a continua reutilização da oportunidade disponível, abrindo a possibilidade de contrair um novo empréstimo imediatamente após a quitacao de um anterior.
Claro que onde existe a cobrança de juros, a quitação do empréstimo já é estimulada pela própria eliminação deste. Porém a possibilidade de adquirir um novo empréstimo de maior monta, ou mesmo o simples fato de poder acessar novamente o crédito, é por si só um estímulo mais do que suficiente para que se quite o empréstimo o mais rapidamente possível.
Ademais tal possibilidade de quitação aumenta em decorrência do próprio incremento do capital gerado a partir do microcrédito. Isto ocorre evidentemente no microcrédito produtivo, mas não exclusivamente neste modelo. Conforme observamos em Quatinga Velho, mesmo um microcrédito aplicado em um bem de consumo, como uma TV, ou um computador, pode representar não só a médio e longo prazo em crescimento das possibilidades socioeconômicas da família, mas também a curto prazo, a medida que o acesso a muitos bens de consumo também aumentam indiretamente as oportunidades e possibilidades produtivas do indivíduo e da comunidade.
Tal incremento não pode ser deduzido diretamente a partir de um estudo particularizado, linear e reduzido. Mas isso não é razão para eliminar essa possibilidade de desenvolvimento do programa. Embora torne evidentemente mais complexo o planejamento do programa de microcrédito ter que trabalhar com tais variáveis, é possível contornar essa dificuldade priorizando os microcréditos não só de menor monta, mas cuja possibilidade de quitação mais rápida sejam mais evidentes.
Deixando-nos abertos para trabalhar durante a experiência com a hipótese de que em sistema de microcrédito que envolve maior numero de empréstimos, o retorno possa ser maior se não condicionado a uma única tipificação de crédito. Talvez não apenas a multiplicação dos beneficiados, mas uma maior diversidade em suas finalidades possa produzir um conjunto muito maior de oportunidades aproveitadas em relação a outros modelos em que as finalidades de créditos concedidos são reduzidos a tipificações enumeradas e controladas.
Assim a preferência pelos denominados microcréditos para produção dentro do programa se darão neste momento pelas limitações dimensionais do sistema, e do reconhecimento de nossa impossibilidade para efetuar o cálculo complexo de previsão das reais possibilidades desenvolvimento da economia local com a diversificação dos microcréditos.
Ademais é possível que tais cálculos sejam não apenas dispensáveis, mas menos efetivos diante de critérios, simples, não-arbitrário e o mais importante: entendidos como justos pela comunidade conforme deliberação democrática. Neste sentido como critério ainda mais simples de elegibilidade, ou melhor, prioridade para o empréstimo, dado que o montante é limitado, sugerimos a adoção do critério mais fácil de ser entendido, aplicado e controlado por democracia direta. Nesta primeira fase do microcrédito iremos priorizar:
i. os microcréditos de menor monta - que salvo exceções atenderiam justamente a sua finalidade, atendendo quem menos têm e proporcionalmente mais precisa. Gerando ainda um retorno mais rápido sem comprometer o orçamento da família.
ii. como critério em eventual desempate: os microcréditos quitados em menos tempo.
Já a preferência, ou melhor prioridade na concessão de novos créditos aqueles que já quitaram seus empréstimos, se dá não apenas como estímulo ou reforço para uma quitação imediata visando reduzir o tempo para recompor o capital , mas também como importante processo de educação financeira essencial para modelos que apostam na livre iniciativa e liberdade dos envolvidos.
Da mesma forma que a gradação nos montantes emprestados, partidos dos valores e restituições mais modestas possíveis não é apenas uma questão de preocupação com o comprometimento e privação de uma renda básica já extremamente modesta , mas prudência que funciona como processo pedagógico - não precisando contar que todos saberão de imediato lidar com o microcrédito. Aqui cabe uma advertência: talvez essa precaução seja absolutamente desnecessária e sejamos mais uma vez surpreendidos pela responsabilidade e capacidade inatas das pessoas (como já o fomos com os sistemas livres e a renda básica). De qualquer forma ao longo do projeto podemos flexibilizar e até mesmo eliminar essas regras se assim se não se mostrarem efetivas.
É importantíssimo frisar que não estamos partindo do princípio de que pessoas não são capazes de identificar, planejar e aplicar adequadamente esse crédito de modo a não passar por condições adversas, mas admitindo a possibilidade que quem jamais teve chance de apreender com a melhor escola que existe, a experimentação, precisa de espaço para aprender com suas tentativas e erros. Processo de desenvolvimento de um potencial natural que antes de tutores precisa de oportunidades para o aprendizado.
Assim, ao partir de montantes e restituições de baixa monta, procuramos reduzir o possível impacto de um microcrédito que mal aplicado pelo tomador não dê um retorno esperado ou mesmo nenhum, de modo que mesmo o erro possa ser absorvido sem prejuízos materiais ao indivíduo, ou ao seu processo de educação financeira. Afinal, de qualquer forma o empréstimo será quitado no prazo original, abrindo nova oportunidade para uma tentativa dentro dos mesmos patamares ou, conforme o entendimento advindo da experiência, em níveis até menores de comprometimento do orçamento.
O conceito é prover um sistema de crédito onde a confiança e iniciativa não seja prejudicada pelos inevitáveis tropeços, e que ao mesmo tempo se constitua em um processo no qual é o tomador de empréstimo que recebe e sente as conseqüências deste processo em um nível adequado as suas condições socioeconômicas e psicológicas, desenvolvendo assim a responsabilidade e preparando-se de fato e naturalmente para assumir compromissos maiores. A isso entendemos como o próprio processo de aprendizado envolvido no programa: a educação como desenvolvimento de potencialidades latentes ou até mesmo bloqueadas pela falta de oportunidade. Oportunidade de aprendizado não apenas para o indivíduo que toma o microcrédito, mas para aquele que o fornece.
Aqui novamente aplicaremos o princípio da democracia direta. Decisão aplicada não na escolha de quem deve ou não deve receber o empréstimo, mas dos níveis de crédito e, sobretudo de um questão importantíssima: o crescimento do capital disponível para o microcrédito. Tudo isso poderia ser facilmente resolvido com o juros conforme deliberação democrática da comunidade, seja com níveis iguais, equitativos, progressivamente menores ou mesmos maiores. Lembrando que neste modelo os juros não são uma “compensação ou recompensa pelo risco”, mas sim um excedente dirigido a manutenção operacional do sistema e crescimento do capital disponível ao microcrédito.
Pode-se ser inclusive que tais finalidades descaracterizem esse pagamento excedente como juros. Porém para não nos perdermos em predefinições, adotaremos em princípio a solução de acrescer o capital por doações dos próprios tomadores de empréstimos. Doações que podem inclusive estar baseadas em percentuais do valor emprestado, sendo doadas mês ao mês ou como se fossem parcelas adicionais após a restituição do empréstimo. Comportando-se exatamente como o pagamento de juros, mas não se caracterizando como tal por uma razão muito simples: seu pagamento é voluntário e jamais se configura como uma dívida ou compromisso de contribuição disfarçado.
O que não impede que a comunidade entre em acordo para que todos contribuam com valores iguais ou equitativos para esse fundo de microcrédito, atrelado ou não aos empréstimos, o que equivaleria neste segundo caso a uma espécie de contribuição associativa para o microcrédito . Ninguém sendo obrigado a contribuir, mas não tendo também a associação o compromisso de emprestar para quem não contribui, ou seja, mutualismo.
O importante aqui será o trabalho informativo. Dado que o crescimento do volume disponível do microcrédito é do interesse dos próprios usuários, a contribuição voluntária é perfeita viável porque condiz aos interesses particulares de cada um na medida da compreensão do fato que o aumento do microcrédito disponível depende da própria de todos. Aqui cabe novamente um paralelo com a Brinquedoteca e Biblioteca Livres, que num dado momento passou a receber doações dos próprios usuários. É obvio que isso não aconteceu em virtude de nenhum cálculo racional utilitarista, mas sim de impulso ou instinto de solidariedade ou mais precisamente de reciprocidade ou gratidão inerentes não apenas ao seres humanos, mas a todos seres vivos dotados de inteligência suficiente para tanto .
Em suma a renda básica não apenas serve de calção e capital para o microcrédito , mas como fonte geradora da demanda a ser atendida pelos microempreendimentos emergentes. Note-se que o pagamento de juros poderia propiciar não apenas o crescimento dos montantes disponíveis ao microcrédito, mas uma maior renda básica, inclusive concomitantemente.
Por exemplo: uma família com 10 membros, que recebe por mês uma renda básica de 30 reais por mês, poderia estar precisando de justamente 300 reais para comprar galinhas e materiais para construir um galinheiro e vender os ovos na vizinhança. Ela poderia tanto decidir pagar esse empréstimo deduzindo três reais de cada renda básica durante 10 meses, ou apenas 1 real durante 30 meses, ou em qualquer arranjo possível considerando:
• a disponibilidade de recursos depositados no fundo;
• e as possibilidades de comprometimento de uma parte da somatória das rendas básicas dos envolvidos.
Independente do sucesso ou não do empreendimento a restituição sempre ocorre na pior das hipóteses dentro no prazo combinado, e se as possibilidades da família tiverem sido bem consideradas, sem nenhuma privação. Dependendo ainda do retorno desse microempreendimento, aqui no caso a venda dos ovos, será sempre interessante para o tomador do microcrédito quitá-lo o mais rapidamente, abrindo nova possibilidade para receber o adiantamento, com mais confiança e experiência para talvez tomar valores maiores do que o primeiro.
Note-se que não apenas famílias poderão usar sua renda básica, mas famílias associadas ou até mesmo toda a comunidade, no caso de um empreendimento coletivo, como a compra de um veículo para uso comunitário, a abertura de um poço, a criação de uma cooperativa de consumo ou produção, ou qualquer outro empreendimento que careça ou passa ser realizado em comum acordo por um grupo.
No momento que estes microempreedimentos formarem uma considerável economia local será possível incrementar estes empréstimos no todo ou em parte através de moeda social. Mas isso é próxima etapa que deverá ainda aguardar as primeiras avaliações do resultado do microcrédito por renda básica e os sempre necessários ajustes que só a experiência pode propiciar a qualquer programa.

Arqueologia do Absoluto

A História como construção do Futuro

Quando o ser humano passou a ter uma mentalidade servil? A relação liderança-subverniência existe nos animais? As relações de poder são sinal de evolução ou corrupção?

No mundo animal as relações podem ser tanto violentas quanto solidárias, contudo não se pode dizer que o fenômeno da servidão e escravidão simplesmente tenha surgido espontaneamente. Eles sempre estiveram presentes como uma alternativa ou estratégia, bem ou mal, sucedidas para a perpetuação das espécies, mas não como conseqüência predeterminada de suas causas.

Tomar o passado como base para o futuro é um uso válido do conhecimento da história, mas para a construção deste conhecimento é necessário a abordagem inversa: estudando o passado como se olhássemos para o futuro. Ao assim proceder não apenas conseguimos nos livrar da falsa impressão que o passado não poderia ter sido diferente, mas sobretudo da maldição da predestinação, na qual as possibilidades do futuro são uma ilusão causada pelo desconhecimento de um futuro que a imagem e semelhança do passado já está definido, cabendo a nós apenas descobri-lo e cumpri-lo.

Nada mais enganoso. Não só devemos não olhar o futuro como se fosse o passado, mas passar a estudar o passado como se fosse o futuro, buscando nos inserir nele como se estivéssemos presente. Esse exercício mental jamais nos dará uma perspectiva perfeita do passado, mas nos permitirá entender que aquilo chamado de presente e tido como inexorável, era naquele momento apenas uma entre tantas possibilidades de futuro. E não porque está foi a escolhida que ela era a única alternativa possível.
O passado é inegavelmente linear, mas não é uma cadeia de causas e conseqüências, as causas explicam as conseqüências, mas o fator determinante são as escolhas dos agentes dotados de vontade que atuam não no campo do desconhecido, mas sim no campo daquilo que precisa ainda ser determinado. De modo que as tomadas de decisão do presente, serão as inexoráveis cadeias de causas e conseqüenciais dos observadores futuros.

A história tomada não como descrição de processos lineares reduzidos, mas sim como descrição sistemas complexos não-deterministicos. Por que? ou melhor para que? Entender a historia como o produto de múltiplos processos de tomadas de decisão individuais e coletivas não serve apenas para compreender o passado, serve acima de tudo para conceber que o futuro não é objeto de previsão ou descoberta, mas de construção.

Futuros Encarcerados

A quebra do predeterminismo não é apenas uma questão metodológica, ela é fundamental para compreensão do fenômeno que nos propomos a entender, pois sendo uma manifestação do mesmo, não poderemos compreende-lo sem superar as limitações que a sua estrutura impõe as abordagens para além da sua perspectiva.
Assim tomando a seleção natural não só dos indivíduos, mas dos coletivos enquanto produto de suas escolhas e estratégias frente as possibilidades, o que vamos pretendemos é levantar uma hipótese que poderia servir de princípio para uma Arqueologia do Absoluto, onde se buscaria não apenas por signos de poder, mas símbolos de um culto ao Poder Total.

Relações de poder e violência sempre existiram. O é num dado momento da espécie humana por conta da capacidade de abstração é a concepção do absoluto, enquanto a noção do poder total, que gera as representação atemporais e temporais do Todo Poderoso, respectivamente Deus e o Estado. Gerando sociedades voltadas para o totalitarismo. E estamos ainda de tal forma imersos nesta condição pervertida de nossa humanidade que se quer nos damos conta de que essa idolatria ao absoluto enquanto processo de desinteligência e desumanização será a perda da nossa humanidade.

Se o comportamento de poder e violência existe na natureza como expressão primitiva de brutalidade, isto explica os atos, comportamentos e condições mais primitivos das pessoas, ou mais propriamente as suas características mais desumanas, contudo não explica o surgimento das características que diferenciam o ser humano das demais espécies, pelo contrário, representam claramente uma contradição da natureza humana.

Assim a pergunta que precisa ser feita é como o ser humano apesar de sua brutalidade e animalidade conseguiu desenvolver suas características humanas? Afinal não foi agredindo e atacando que o ser humano desenvolveu sua extraordinária habilidade de comunicação. Nem foi usando armas que consegui desenvolver sua capacidade de entendimento. As características que nos definem enquanto seres humanos e que nos permitiram desenvolver aquilo que denominamos cultura. ou seja desenvolver a inteligência ao invés de mandíbulas e dentes mais afiados é produto de uma estratégia evolutiva a que chamamos inteligência, que na própria origem da palavra significa capacidade de intercomunicação.

Cooperação-Competitiva

Assim a primeira pergunta não é exatamente o que aconteceu com a HUMANIDADE de modo que esta veio a perverter-se, se voltando para animalidade não apenas com uma força inédita mas com uma estupidez sem precedentes entre todos os animais. A pergunta é como o ser humano consegui desenvolver sua humanidade em condições brutais de competição pela vida que jamais cessaram.

Claro que a vida não pode ser reduzida a mera luta violenta pela sobrevivência num mundo de recursos escassos. A abundância também ocorre permitindo o desenvolvimento de novas capacidades. Ademais a cooperação também é uma característica que pode surgir na escassez. Assim como a abundância mediante a concorrência. Relacionar a competição como única estratégia necessária onde existe escassez, relegando a cooperação apenas para situações de abundância é uma falácia tão grande quanto pressupor que a competitividade não possa e deva surgir na abundância e que a cooperação é pelo contrário a melhor estratégia na extrema escassez. De fato pretendemos demonstrar que a evolução humana está baseada na combinação destes dois elementos, cooperação e competição, para formação de uma estratégia complexa. Uma estratégia a qual denominamos cooperação-competitiva, onde a ordem dos fatores altera o produto já que a característica fundamental desta estratégia é a criação de um estado permanente de abundância onde se pode competir pelo desenvolvimento e não pela mera sobrevivência, através da cooperação para manter esse estado.

Baseada na teoria do jogos, temos que a melhor estratégia individual para qualquer jogador é vencer sem quebrar o jogo, o que leva todos competidores a cooperar naquilo que é seu interesse comum: a existência das condições onde existem vencedores e perdedores, e não presas e predadores. Assim na famosa frase “o importante é competir” deve se ler dois princípios:

• Que deve se competir para vencer.
• E que deve se competir cooperando para a própria existência do jogo.
Sendo o ultimo princípio enunciado o primordial a ser respeitado sob pena de não haver lugar para o segundo. Quando os jogadores perdem a noção deste princípio essencial, base da sua inteligência coletiva, o sistema colapsa.

Autonomia

Assim o processo evolutivo humano ocorre a cada ato de renuncia a violência e a brutalidade, em pro da concorrência para atingir um mesmo objetivo, uma relação ao mesmo tempo cooperativa e competitiva. Essa correlação permitiu que o ser humano desenvolvesse uma capacidade inédita de atuação coletiva, conseguindo atuar com unidade e sem contudo perder sua individualidade, isto é, não apenas em união geradora de massas, mas em comunhão formadoras de indivíduos autônomos.

Aliás é dentro da comunhão que estão as condições para o surgimento desta nova noção de individualidade, que escapa da dicotomia primitiva de: ou obedecer a vontade geral; ou viver isolado de todos. de acordo com esta dicotomia, em comunidade o homem é livre das privações naturais, mas prisioneiro da obediência a vontade comum, ou seja, há muita coisa para se fazer, mas poucas são permitidas. Por outro lado, na vida selvagem se é livre da obediência a sociedade, mas prisioneiro das privações inerentes a um ser sozinho, onde se pode fazer o que se quiser, mas não se tem condições de fazer quase nada.

A individualidade é produto destas novas sociedades humanas não baseadas na união pelo medo e a cobrança de obediência, mas das sociedades fundadas na comunhão de interesses e baseadas na liberdade e concordância. De modo que quanto mais evoluída e inteligente é a sociedade maior é capacidade dela não apenas de tolerar as diferenças e diversidade de personalidades e comportamentos, mas aproveitá-los para a geração do bem comum. Assim como a diversidade genética aumenta as chances de sobrevivência de um grupo, a diversidade cultural aumenta as das sociedades.

Liberdade em Rede

Assim a liberdade individual não é produto da segregação ou separação dos indivíduos de uma coletividade, mas do desenvolvimento e afirmação de suas características diversas e particulares que só fazem sentido dentro uma coletividade,isto é, que só se tornam particulares justamente pelo contraste ou relação com as particularidades de todos os demais. O indivíduo emerge, portanto do coletivo como a afirmação de um nodo dentro de uma rede. Fora da rede ele, sem a possibilidade de produzir as conexões ou relações que constituem aquilo que o define, perde sua identidade e na natureza se torna parte do meio, perdendo toda e qualquer possibilidade de apresentar um comportamento diferente daquele que é o necessário para a sua sobrevivência.

Vontade

Via de regra em qualquer estado natural ou artificial onde o indivíduo perde a capacidade de manifestar sua vontade e passa ser governado por causas e conseqüências, ele deixa de ser indivíduo para ser parte do meio. É uma parte do sistema e do seu meio ambiente regida por leis naturais ou artificial que comandam seu comportamento previsível. Afinal dá para se ter uma boa idéia das conseqüência de se chutar uma pedra ou leão, mas ao chutar de um ser dotado com a vontade humana podemos esperar as mais diferentes reações, até mesmo a incrível, e claro rara, não-reação. A vontade, antes de ser uma força criativa, é uma força primordial de toda evolução, através da não-violência e desobediência: A primeira essencial ao desenvolvimento da inteligência; a segunda da liberdade, ambas em conjunto são a base da superação da força bruta e superstição, a transição da fase da ciência para a fase da consciência, isto é, a superação do “eu sei”, para a percepção do “não sei’. A principal diferença cognitiva de uma evolução humana ainda em processo: a capacidade de lidar com sistemas complexos baseados na incerteza.

Da Ciência e Consciência

Ora essa capacidade como qualquer outra não se desenvolve de forma homogênea e para sua emergência será necessário superar primeiro aquilo a que denominamos de culto ao Absoluto que impede que lidemos como múltiplas verdades, ainda que não necessariamente relativas, mas complexas.

O culto nos impede de compreender a realidade enquanto a própria complexidade, que não pode ser reduzida nem aquilo que é atualmente conhecido, nem ao previsto, mas que precisa ser trabalhada cognitivamente tanto com uma quantidade sem fim de elementos desconhecidos a serem descobertos, quanto com os próprios limites epistemológicos tanto da cognição quanto da intelecção, desenvolvida, portanto como sistemas de compreensão capaz de lidar com a realidade sem pressuposições de que conhecemos ou podemos conhecer tudo e o todo, assim como trabalhando também com aquilo que só pode ser conhecido subjetivamente.

Assim a superação da ciência pela consciência que se dá na mente humana precisa ser trazida a realidade para dentro das relações humanas, espelhadas em nossas sociedades. De modo que não sejamos apenas seres dotados de humanidade, mas que convivamos como Humanidade. Se individualmente somos seres inteligentes, coletivamente não passamos ainda da infância da humanidade, se é que vamos sair dela, como comprova nossos sistemas econômicos baseados em psicologia infantil e infantilizante.

Para construir sociedades humanas e inteligentes e finalmente podermos nos definir realmente como Humanidade, precisamos trazer o homem de volta de seu delírio epistemológico de onipotência e onisciência, motivado por seus anseios infantis de imortalidade, mantidos paradoxalmente por uma cultura de guerra e morte. Precisamos por um fim ao esse idolatria ao poder total.

Culto ao absoluto

Assim a segunda pergunta é exatamente quando o mesmo ser que desenvolveu sua humanidade através da não-violência, da desobediência ou inconformismo e sobretudo através da cooperação-competitiva se tornando inteligente e solidário, perdeu a noção de sua essência e não apenas voltou a apresentar um comportamento brutal e violento, mas com níveis de predação e individualismo que jamais poderiam ocorrer em condições primitivas, sob pena de auto-extinção, naquilo que não pode ser mais chamado apenas de brutalidade, mas sim de maldade.

O que praticamente equivale a perguntar quando o homem inventou a Maldade?
Pode-se dizer que a maldade é um ato de estupidez ou violência cometida por um ser que utiliza sua inteligência para promover ações danosas a outros. É estúpida não apenas porque seu uso generalizado implica a longo prazo dentro de uma sistema complexo como a realidade em prejuízo a todos incluso do próprio agente, mas porque conforme demonstramos carece justamente do componente solidário que determina o desenvolvimento da inteligência, fazendo que esse comportamento promova a destruição tanto do sistema quanto o retrocesso do desenvolvimento humano ou inteligente.
Porque fazemos isso? Ou porque constituímos sociedades tão estupidamente egoístas, ou estúpidas?

A Maldade

Não podemos dizer que esse é um estagio necessário a evolução humana. Porque conforme veremos preconceber a evolução como uma linha única já é um produto de valores absolutos.Contudo o culto absoluto ou o totalitarismo é uma armadilha fácil de se cair perante a força da união.

É evidente que o nível de coesão dos grupos e a capacidade destes de atuar como uma unidade ordenada representou uma evidente vantagem evolutiva, pelo simples diferença evidente que existe entre ter um aliado ao invés de um inimigo. Contudo uma unidade antes de se manifestar na realidade precisa existir como uma concepção, e a na concepção desta unidade reside a diferença entre o Bem Comum e o Mal. O bem como uma unidade promovida em harmonia de pluralidade, ou enquanto um sistema de equilíbrio e cooperação da maior diversidade possível. E o mal como a unidade enquanto supremacia da singularidade obtida desde a supressão das diferença até o extermínio dos diferentes. O bem como a força criativa onde o Uno é a multiplicação e diversificação e renovação da existência, Universo. O mal como força destrutiva onde o Uno é obtido por anulação do outro, eliminação do novo e reprodução ou eternalização do mesmo. O Bem, vida e morte, o mal a eternalização do mesmo, mortos-vivos, mumificação, o anseio da juventude eterna e imortalidade.O Bem é a unidade de complexidade e multiplicidade, variedade e diversidade crescentes. O mal a unidade simplificada, reduzida e uniformizada na noção do único, absoluto, e verdadeiro.

A verdade

A verdade enunciada enquanto exclusão de diferentes perspectivas, mas de diferentes percepções, cognição e formas de intelecção, não apenas como correspondência da realidade, mas como única descrição, percepção e pensamento possível para a realidade. Idéia que pretensamente a única não se afirma, e sim demanda a exclusão de todas as demais.

Mas isso não é ilógico? A verdade de A não implica na falsidade ao menos da negação A? Como pode a afirmação e a negação de algo não serem excludentes?

A resposta é: bastando não tomar como a realidade o sistema epistemológico onde algo é afirmado ou negado como a expressão única da realidade. O que não apenas permite que se expresse o mesmo de diferentes formas, mas permite que se componham noções de realidade com uma compreensão da realidade com complexidade proporcional a multiplicidade, variedade e porque não contrariedade de intelecções da verdade, que integradas e não reduzidas formam uma rede de verdades complexas, muito mais próxima do real, conquanto não apenas trabalhe com essa diversidade intelectual mas seja capaz de trabalhar como incógnitas das possibilidades de compreensão não apenas a incerteza, mas o desconhecido. Compondo e ampliando a partir deste processo epistemológico não apenas o conhecimento, mas o própria compreensão do incognoscível.

Os juízos

Contudo o culto ao absoluto não é um produto do raciocínio, mas um sentimento que gera a racionalização da verdade como juízo. A verdade e a falsidade são produto do julgamento, são sentenças promulgadas por uma mente tribunal soberana sobre o que se dá aos seus sentidos de acordo um mundo que a imagem e semelhança do homem também é governado por forças e leis. E o saber passa a se compor como juízo de verdade, superior a própria realidade, negando como prova aquilo que não esta previsto na lei, e negando como real aquilo que a lei não prevê. O saber absoluto se compõe não portanto do reconhecimento daquilo que se conhece e desconhece, mas sobretudo da negação do desconhecido, chamando de Ciência a forma mais absoluta de ignorância. O processo de sistemática negação da descoberta. Não é a toa que a mudança de todo paradigma cientifico é antes uma mudança mais política do que cientifica.

O poder

Na essência do culto ao absoluto está a repressão da liberdade geradora de um estado psicológico de desejo e idolatria ao poder que se dissemina como uma doença. Onde o indivíduo outrora reprimido extravasa sua vontade de ser e realizar no outro que um dia irá compensar sua frustração dentro das mesmas relação de poder.

Como o desejo de poder fora de si, se converte em verdadeira idolatria ao poder?
Essa é uma questão que vale uma reflexão mais profunda. Por aqui nos resumiremos afirmar que o culto ao absoluto é a maior perversão da humanidade e a própria perversão dos valores humanos mais fundamentais: A comunidade pervertida em totalidade. O entendimento em julgamento. A liberdade em poder. Neste mundo a incerteza é confundida com a insegurança. A sabedoria com autoridade. E a proteção com dominação. Produzindo a noção de a vida que não tem um destino predeterminado não é uma vida com sentido. Quando a indeterminação é a própria dádiva da vida, que permite a todo ser dotado de vontade e liberdade para exercê-la decidir qual sentido dará a sua própria vida – oportunidade que é a própria essência e razão da existência. Assim o ser liberto do culto ao absoluto, a fonte de uma angustia existencial da falta de sentido da vida, se torna o indescritível estado de espírito do ser verdadeiramente vivente que busca e cria com toda sua vontade o significado à vida.

Toda a evolução e manifestação material é produto desta decisão. E não há um ser no Universo que não seja produto desta vontade, e nenhuma forma material que não seja a manifestação deste espírito, a Liberdade: o princípio, meio e sentido da vida.